Rastros da História: Inocência, sertão e a realidade dos escravos
“Inocência”, de Visconde de Taunay, é um marco da literatura brasileira que oferece uma visão autêntica do sertão de Sant’ana do Paranaíba em meados do século XIX. A obra, ambientada em uma época de profundas transformações sociais e econômicas, traz à tona aspectos da vida no interior do Brasil, destacando a relação dos personagens com a terra e a natureza, além de retratar a complexa estrutura social baseada na escravidão.
Neste contexto, a escravidão não apenas sustentava a economia das grandes propriedades rurais, mas também estava profundamente enraizada nas práticas legais e culturais da época.
Na região do atual território do Estado de Mato Grosso do Sul, precisamente em Paranaíba, à época Sant’ana do Paranaíba, onde diversas famílias oriundas de São Paulo e Minas Gerais, lideradas pelo capitão José Garcia Leal, começaram a se estabelecer no início do século XIX, o trabalho escravo era uma realidade comum.
Esses pioneiros, ao desbravarem e ocuparem vastas áreas, trouxeram consigo não apenas seus costumes e tradições, mas também os escravos, que eram vistos como parte essencial da força de trabalho para a construção de fazendas e infraestrutura local.
Os escravos, além de trabalharem nas propriedades, eram frequentemente incluídos em inventários e partilhas de bens, sendo herdados por descendentes como parte do patrimônio familiar.
A obra de Taunay, embora fictícia, reflete as condições reais enfrentadas pelos escravos na época, ilustrando como eles eram tratados como bens móveis, sem direitos ou autonomia. Este sistema, que também se refletia no sertão dos Garcias, como a região de Paranaíba era conhecida, estava institucionalizado e legitimado pelo Poder Judiciário, de acordo com a legislação deste período triste da história.
José Garcia Leal, um dos principais líderes políticos da região e figura de destaque na formação do povoado que daria origem a Paranaíba, também lidava com essa realidade, como evidenciado pela documentação de sua época, que incluía, entre outras coisas, cartas de liberdade para alguns escravos.
Dos dados existentes nos arquivos da Assessoria de Gestão Documental e Memória, do Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul, se destaca o inventário de José Garcia Leal deixando uma parte de terras para os negros alforriados e os escravos, além de alguns processos criminais envolvendo escravos.
A história de Paranaíba e seus fundadores é emblemática do período de colonização do interior do Brasil, época em que o avanço da fronteira agrícola e o progresso de acessos, como a estrada do Piquiri, construíam um novo futuro para si mesmos e suas famílias.
Em “Inocência”, Taunay capta não apenas o bucolismo e a beleza natural do sertão, mas também a dura realidade social que o sustentava, proporcionando uma visão crítica e reflexiva sobre a história brasileira.
Dessa forma, o romance “Inocência” e a história de Paranaíba se entrelaçam com aspectos fundamentais da vida no Brasil do século XIX. A obra de Taunay, ao retratar a realidade, oferece uma contribuição valiosa para a compreensão da complexa história do Brasil, ao mesmo tempo em que homenageia a resiliência e a humanidade daqueles que viveram nesse período, de cujo os quais se formaram cidades pujantes, como Paranaíba.
Convite – No dia 18 de outubro, às 9 horas, na sede do Fórum de Paranaíba, o Poder Judiciário de Mato Grosso do Sul comemora os 150 anos da Comarca. O presidente do Tribunal de Justiça, Des. Sérgio Fernandes Martins, convida para a programação que contará com inauguração de monumento, exposição, cápsula do tempo, selo, projeto Rastros da História, lançamento de livro e sessão comemorativa com a presença de Desembargadores e autoridades do MS.
Redação: Impacto Mais – Mirtes Ramos
Fonte e arte: Secretaria de Comunicação TJMS