9 de dezembro de 2024

Expedição Rota Bioceânica vai fazer ‘test drive’ em megaestrada que liga o Brasil ao Chile

Terceira edição da RILA sai de Campo Grande com destino ao Chile no dia 24 de novembro

Terceira expedição da RILA sai de Campo Grande no dia 24 de novembro com destino ao Chile — Foto: Setlog/MS/Divulgação
Terceira expedição da RILA sai de Campo Grande no dia 24 de novembro com destino ao Chile — Foto: Setlog/MS/Divulgação

 Anderson Viegas

Uma expedição formada por empresários, autoridades e representantes de instituições de ensino e de pesquisa, embarca no dia 24 de novembro, em Campo Grande, para fazer um verdadeiro “test drive” da Rota Bioceânica, a megaestrada que vai ligar o Brasil – tendo como ponto de partida Porto Murtinho, em Mato Grosso do Sul – aos portos de Iquique e Antofagasta, no Chile.

Essa será a terceira expedição da Rota da Integração Latino-Americana (RILA), promovida pelo Sindicato das Empresas de Transporte de Cargas e Logística de Mato Grosso do Sul (Setlog/MS). Há dez anos a entidade capitaneia a busca por uma rota alternativa e mais competitiva em relação aos portos brasileiros do sul e sudeste, para escoar as exportações estaduais e nacionais destinadas principalmente aos mercados asiáticos.

O diretor administrativo do Setlog/MS, Dorival Oliveira, lembra que há mais de 4 décadas se discute a criação de um corredor que ligaria os oceanos Atlântico ao Pacífico, no coração da América do Sul, mas que nenhuma iniciativa havia prosperado. Ele diz que em 2013, diante de uma crise logística no país, que provocou a formação de longas filas nos principais portos nacionais, a entidade encampou a busca por uma alternativa.

Dorival diz que a primeira opção foi tentar acessar os portos chilenos cruzando a Bolívia, saindo do Brasil por Corumbá, no oeste de Mato Grosso do Sul. Ele diz que a primeira edição da RILA apontou que apesar de todo o trecho já estar pavimentado nos países por onde a rota passaria, que não haveria viabilidade por conta de dificuldades técnicas, ineficiência da integração nas fronteiras e instalabilidade política na Bolívia.

Ele diz que a procura por um corredor viável continuou. Em 2017, uma segunda edição da RILA foi promovida pelo Setlog/MS, desta vez, voltada para testar a viabilidade de um novo trajeto, tendo como ponto de partida Porto Murtinho, no sudoeste do estado.

Desta vez, a megaestrada passaria pelo Paraguai, em vez da Bolívia. Participaram empresários, autoridades de todos os países envolvidos, universidades e a imprensa. A delegação saiu de Campo Grande com destino a Antofagasta e Iquique.

Ao longo do trajeto foram realizadas reuniões com as comunidades locais, apresentando o projeto, os benefícios que rota entregaria e o desenvolvimento que ofereceria a todos. A expedição apontou a viabilidade desse trajeto, apesar da necessidade da pavimentação de pouco mais de 600 quilômetros no Paraguai e da construção de uma ponte ligando o país ao Brasil.

As autoridades dos países se convenceram que esse era o caminho ideal, e o governo do Paraguai encampou o projeto como um instrumento para promover o desenvolvimento de uma das regiões mais carentes do país, a do Chaco – o Pantanal Paraguaio.

O governo paraguaio dividiu a obra de pavimentação em três trechos. O primeiro de Carmelo Peralta a Loma Plata tem 277 quilômetros já foi concluído. O segundo, de Cruce Centinela a Mariscal Estigarribia, tem 102 quilômetros e investimento previsto de US$ 110 milhões.

Segundo o ministério de Obras Públicas e Comunicações (MOPC) do país vizinho, sua pavimentação deve ocorrer após o trecho três, já que existe outra rodovia na região, a PY09, que foi remodelada e pode funcionar como alternativa para o trecho.

Em relação ao terceiro trecho, em março foi assinado o contrato para pavimentação dos 224,8 quilômetros, que terá investimento de US$ 354,2 milhões.

Além da pavimentação, o governo paraguaio por meio da sua administração de Itaipu Binancional, está investindo na outra obra necessária para viabilizar o corretor. A ponte da Bioceânica está sendo construída entre Carmelo Peralta, no Paraguai, e Porto Murtinho, no Brasil.

A ponte está sendo construída por um consórcio binacional, com investimento de R$ 575,5 milhões. A estrutura terá 1.310 metros de comprimento e 20,10 metros de largura. Em sua página na internet, o consórcio Pybra, formado pelas empresas Tecnoedil Construtora, do Paraguai, e Cidade Ltda e Paulitec Construções, do Brasil, aponta a conclusão das obras no primeiro semestre de 2025. No início de outubro o MOPC apontou que mais de um terço das obras da ponte de Bioceânica já havia sido concluído.

Para conectar a BR-267 a ponte da Bioceânica, no Brasil, será construído um acesso. O edital, que prevê a execução em conjunto com o contorno rodoviário de Porto Murtinho, e o centro aduaneiro entre o Brasil e o Paraguai, foi publicado em setembro deste ano pelo Departamento Nacional de Infraestrutura de Transporte (DNIT).

Questão alfandegária

O diretor do Setlog/MS comenta que com o avanço das obras que viabilizam fisicamente o corredor, os quatro países concentram seus esforços na discussão da questão alfandegária.

O ministro de carreira do Ministério das Relações Exteriores (Itamaraty), João Carlos Parkinson, defende a implementação nas aduanas fronteiriças dos quatro países de processos simplificados e centros de controle integrados, a exemplo do que ocorre no Passo de Jama, que fica na Cordilheira dos Andes, na fronteira entre a Argentina e Chile.

O ministro aponta que com a integração digital e procedimentos antecipados haverá uma interferência mínima na estrada e na fronteira, com desembaraço aduaneiro feito entre 3 e 6 horas.

Ele apontou que o controle da carga deve ser limitado à simples verificação da documentação, da garantia e do lacre.

Parkinson disse recentemente ao g1 que em uma aduana não integrada, o tempo de um caminhão parado pode chegar a 72 horas, com um custo de R$ 3,3 mil, em razão das despesas com diárias, alimentação, seguro, multa por atraso. Em contrapartida, em uma aduana integrada, em que equipes dos dois países trabalhem lado a lado nas áreas de segurança, vigilância sanitária e desembaraço aduaneiro, esse tempo cai para 6 horas e o custo despenca para R$ 281,15.

Neste contexto, o setor produtivo e de logística, o Poder Público, instituições de ensino e pesquisa promovem em 2023 a terceira edição da Rila. O objetivo, conforme Dorival, é verificar as condições para a utilização da megaestrada e os avanços na área de aduanas e autoridades intervenientes de comércio exterior.

Ele explicou que essa expedição terá um diferencial importante. Além de caminhonetes com os participantes percorrerem o trecho de 2,2 mil quilômetros de Campo Grande até Antofagasta, no Chile, passando por Paraguai e Argentina, que em um momento anterior, um caminhão com carga vai sair da capital sul-mato-grossense com destino a cidade chilena.

As dificuldades e gargalos encontrados no trajeto do caminhão serão apresentadas pelos integrantes da RILA no 4º Fórum dos Territórios Subnacionais do Corredor Bioceânico Capricórnio, que deverá reunir autoridades das quatro nações no dia 29 de novembro, em Iquique, no Chile.

Depois do Fórum, a expedição seguirá para Salta, na Argentina, e Assunção, no Paraguai, para reuniões com representantes do setor produtivo e dos governos desses países.

O retorno para Campo Grande está previsto para o dia 4 de dezembro.

Quando a corredor estiver em operação, possivelmente em 2025, um estudo da Empresa de planejamento e logística (EPL) do governo federal, aponta que a megaestrada encurtará em mais de 9,7 mil quilômetros de rota marítima a distância nas exportações brasileiras para a Ásia. Em uma viagem para a China, por exemplo, pode reduzir em 23% o tempo, cerca de 12 dias a menos.

Especialistas em comércio exterior, como Nathália Alves, coordenadora no estado do Agro BR (programa da CNA e da APEX Brasil voltado para fomentar as exportações do agro), aponta que entre os produtos “Made in MS” que podem ganhar espaço no comércio exterior com a rota, estão o complexo carnes, o que inclui as proteínas bovina, suína, de aves e o pescado; a celulose, o mel, farináceos, frutas e seus derivados (doces, compotas e geleias), alimentos oriundos da mandioca (fécula e tapioca) e os provindos do milho (amido e fubá), além de sucos, temperos e especiarias.

Com a rota, Mato Grosso do Sul passará a ser o corredor central no fluxo de pessoas, mercadorias e serviços. Vai diminuir não só as distâncias dos nossos produtos para os países asiáticos, como a China, Coreia do Sul e Taiwan, mas, também para os mercados norte-americano e da Oceania, além de possibilitar uma maior conexão e comércio de produtos e serviços com nossos vizinhos. Apenas com esse encurtamento da distância, os produtos sul-mato-grossenses já vão ganhar muita competitividade em relação aos de outros países e até mesmo de outros estados brasileiros”.

Além desse incremento, o corredor também deve ser uma importante ferramenta de integração cultural e turística entre os quatro países por onde passa.

Para o secretário estadual de Meio Ambiente, Desenvolvimento, Ciência, Tecnologia e Inovação, Jaime Verruck, a rota é um projeto estratégico e prioritário para Mato Grosso do Sul, e que o corredor deve mudar a geopolítica nacional. “Vamos redirecionar cargas que atualmente estão indo para os portos de Paranaguá e de Santos, para os portos chilenos de Iquique e Antofagasta. Da mesma forma, vamos conseguir trazer produtos asiáticos, chilenos e argentinos para o Brasil. Temos uma grande oportunidade para transformar o estado em um hub logístico de entrada e saída de produtos”, analisa.

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